Postado em 01/08/2013
Na última quarta-feira, dia 31/07, reuniu-se
pesquisadores para um debate com alunos e profissionais de saúde no auditório
térreo da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. A gestão da atenção
básica no Rio de Janeiro foi tema de discussão do Centro de Estudos da ENSP. A
atividade contou com a participação de representantes do governo que
apresentaram visões opostas sobre o modelo de gestão da administração da saúde
pública na cidade. Estiveram presentes Paulo Pinheiro, vereador do Rio de
Janeiro; Daniel Soranz, subsecretário de Atenção Primária, Vigilância e
Promoção da Saúde do Rio de Janeiro; Nilson do Rosário, pesquisador da ENSP;
e Maria de Fátima Siliansky, pesquisadora do Instituto de Saúde
Coletiva da UFRJ. Confira, na Biblioteca Multimídia da Escola, as apresentações
e o áudio do evento.
Na abertura do Centro de Estudo, o diretor da ENSP, Hermano
Castro, destacou a importância de debater a gestão da saúde na cidade do Rio de
Janeiro, principalmente no momento em que os questionamentos vêm das ruas e da
sociedade, na busca por uma perspectiva de saúde de qualidade. Maria Angélica
Borges dos Santos, pesquisadora da ENSP responsável pela coordenação do
debate, afirmou que cobertura universal e financiamento da saúde são temas de
ponta e estão em constante discussão. “Ambos são muito caros à
saúde e, para isso, reunimos neste evento diferentes níveis de gestão – executivo, representado pelo
secretário Daniel Soranz, e legislativo, por meio do vereador Paulo
Pinheiro – e acadêmicos para
fomentar a discussão.”
Daniel Soranz, subsecretário de Atenção Primária,
Vigilância e Promoção da Saúde do Rio de Janeiro, abriu o debate e apresentou a
avaliação dos três anos de experiência dos novos modelos de gestão na atenção
básica no Rio de Janeiro. Além de discriminar o que foi e vem sendo
realizado no Rio de Janeiro, ele ressaltou que a opção por determinado modelo
de atenção não está isenta de finalidades e valores, explícitos ou implícitos.
Segundo Soranz, houve, na gestão anterior, um crescimento significativo
dos planos privados de saúde (52,8%) que possuíam 2.459.561 beneficiários, em
2000, e passaram a contabilizar 3.371.459, em 2009.
“O cenário no Rio de Janeiro era complicado. Éramos uma das
cidades com maior gasto per
capita em saúde do país, com
os piores indicadores até 2008, e possuíamos o menor financiamento público
municipal entres as capitais. Além disso, 83% do nosso orçamento em saúde era
em gastos com hospitais”, explicou. A partir de 2009, foi iniciada a Reforma
nos Cuidados em Atenção Primária (RCSP) na cidade do Rio de Janeiro pela Secretaria
Municipal de Saúde e Defesa Civil, que colocou a atenção primária como
ordenadora das redes de atenção. Essa reforma foi dividida em três componentes:
organizacional, administrativo e modelo de atenção. Daniel focou sua
apresentação na reforma administrativa.
De acordo com o subsecretário, a reforma
administrativa possuía muitos desafios: a execução orçamentária, o tempo médio
dos processos, o tempo de remanejo, a transparência dos contratos, o
fortalecimento do Sistema Único de Saúde, entre outros. Com base nessas
necessidades, elaborou-se o arcabouço jurídico para a criação das organizações
sociais de saúde (OSS), que deram origem aos contratos de gestão como convênio.
Desde então, explicou Daniel, a atenção primária está no assento condutor
da saúde na cidade do Rio de Janeiro. Ele citou ainda muitos processos que
tiveram grandes e importantes mudanças após a adesão do modelo de gestão
baseado nas OSS. Por fim, o subsecretário apresentou números que apontam
melhorias de saúde e qualidade de vida da população e ressaltou que, em
2016, a tendência é que os cariocas tenham a maior expectativa de
vida do país.
“Para definição e monitoramento das metas, rever o modelo
de gestão administrativa foi condição sine
qua non. A cidade buscou, a exemplo de outros municípios brasileiros,
o modelo das OSS como alternativa para flexibilidade e agilidade gerencial,
autonomia financeira e administrativa, voltadas para os resultados e para a sua
clientela, com o intuito de racionalizar a utilização dos recursos e incrementar
a prática de prestação de contas, associando responsabilidade na alocação de
recursos a desempenho e resultados sociais. Isso sem dispensar os mecanismos do
aparato estatal de controle e auditoria, como órgãos de Controladoria-Geral e
Tribunal de Contas do Município”, finalizou.
Na contramão das Organizações Sociais de Saúde
Apresentando uma visão oposta à do subsecretário Daniel
Soranz, o vereador Paulo Pinheiro abordou a situação da saúde no Rio de
Janeiro, que, segundo ele, não anda bem. O vereador questionou a retirada da
gestão da administração da saúde e a adesão a uma nova gestão baseada nas OSS.
Ele citou, ainda, alguns projetos de sua autoria que foram apresentados
com vistas à melhoria da qualidade da atenção básica. Em seguida, falou
sobre a Lei n° 5.026 de 19 de maio de 2009, conhecida como a Lei das OSS, que
dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais e dá outras
providências, e salientou as formas de execução e fiscalização dos contratos de
gestão.
Segundo o vereador, muitos contratos de gestão estão sendo
fiscalizados atualmente e podem ser encerrados em virtude do alto número de
irregularidades. Aproveitando o gancho dos dados apresentados pelo
subsecretário de saúde, Paulo Pinheiro questionou os números e apontou a
demora na marcação de médicos e exames, a alta rotatividade de profissionais
médicos, entre outros aspectos latentes na insatisfação da população com a
saúde no Rio de Janeiro. Diante dos problemas citados, Paulo
questionou: por que não a administração direta?
Por fim, o vereador apresentou a proposta orçamentária da
Prefeitura para 2013 e apontou o aumento da receita das despesas decorrentes do
modelo de gestão adotado atualmente na cidade. Encerrando sua apresentação,
Paulo Pinheiro citou as análises do Tribunal de Contas do Município do Rio de
Janeiro (TCM) sobre o desempenho das organizações sociais que atuam sem
concurso e sem licitação e questionou, mais uma vez, a criação da Empresa
Pública de Saúde do Rio de Janeiro, a RioSaúde. “Essa empresa passa a ter
responsabilidade sobre a gestão de todas as unidades básicas de saúde do Rio de
Janeiro. O que nos resta saber é exatamente como pretende atuar a RioSaúde”,
destacou.
O debate retornou para a academia com o
pesquisador Nilson do Rosário, do Departamento de Ciências Sociais da ENSP.
Ele iniciou sua apresentação citando uma oficina, realizada no Rio de
Janeiro, sobre o papel das OSS. Categórico, afirmou que a falta de
coerência entre o que defende e o que implementa é, hoje, a maior crítica ao
sistema de saúde brasileiro. O professor apontou ainda a dificuldade em avaliar
os contratos fechados com base no formato de gestão das OSS e citou que São
Paulo também passou por uma reforma e, atualmente, possui uma atenção
básica favorável. “Necessitamos de mais clareza nas questões políticas. O Rio
de Janeiro é uma cidade dividida que tenta ser global, o nosso desafio é
incluí-lo nessa globalidade”, disse.
Fechando o debate, a pesquisadora Maria de Fátima
Siliansky, do Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ, fez suas considerações
com base em duas grandes pesquisas de que participa. Ela pontuou as lógicas dos
modelos de gestão baseada na administração direta de pessoas e recursos e na
terceirização da gestão. Segundo ela, ao contrário do que vem sendo propagado,
o modelo de terceirização de contratos não é recente e é adotado em outros
países. A professora também descreveu problemas na avaliação no setor serviços,
“quantidade de serviços pode não significar efetividade do sistema de saúde”.
ENSP
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